Empresas burlam a lei e fogem das obrigatoriedades condominiais, causando prejuízo para condôminos. Prática é comum, porém pouco conhecida
Moradores do Residencial Park Style localizado no Jardim Atlântico foi alvo da prática ilegal adotada por construtoras da capital | Reprodução
O hábito de construtoras e incorporadoras em se auto isentar das taxas condominiais não é novo, mas é pouco conhecido. A prática vem se tornando frequente em Goiânia, que já conta com mais de seis mil condomínios, de acordo com o departamento de cadastro imobiliário da Secretaria de Finanças de Goiânia.
A receita é simples: ao entregar um empreendimento, a empresa responsável deve continuar pagando pelas taxas de condomínios dos apartamentos que ainda não foram vendidos. Porém, algumas construtoras fazem uma pequena alteração no estatuto do condomínio, permitindo que este valor seja pago da forma como elas decidirem ou que simplesmente não seja pago.
O advogado e coordenador de condomínios Caio César Mota explica que, no código civil, essa chamada “exoneração” é ilegal. “Essas empresas, enquanto responsáveis pela entrega do condomínio e pela venda dos apartamentos, permanecem proprietários dos imóveis ainda não comercializados sendo, portanto, condôminas, usufruindo os mesmos direitos e deveres dos moradores, ainda que a unidade esteja inabitada”.
Um exemplo é o que aconteceu no Residencial Park Style localizado no Jardim Atlântico, região sul de Goiânia. De acordo com a ex-síndica, Thaís de Castro, a construtora responsável pela entrega do empreendimento era 100% isenta de pagar pelas taxas dos 59 apartamentos ainda não vendidos, desde o lançamento em 2013 até o último ano.
“O condomínio possui 228 apartamentos e, para mudar a convenção e fazer com que a construtora volte a pagar pelas taxas, era preciso da assinatura de mais de 100 proprietários, mas a maioria reside no exterior, o que dificultou o processo”, explica.
Uma das moradoras deste residencial, a fotógrafa Débora Garcia, de 29 anos, foi questionada sobre o assunto pela equipe do Jornal Opção e confirmou que não sabia sobre a auto isenção. Ela admitiu que não frequentava as convenções marcadas e que, por isso, nunca tomou conhecimento da ilegalidade. “É complicado acompanhar as reuniões de condomínio, eu viajo muito, não tenho horário fixo de trabalho, e não tiro um tempo para me atualizar sobre esses assuntos”, diz.
De acordo com o advogado e coordenador de condomínios, Caio César Mota, essa auto isenção da qual as construtoras se beneficiam é algo tido no direito como “letra morta”, ou seja, como é ilegal, não precisa ter a convenção alterada para deixar de valer. “Se houver alguma cláusula na convenção ou estatuto do condomínio que formalize esse benefício para a construtora, ele é contrário ao código civil e considerado nulo”, explica.
Caio alerta, ainda, que outro recurso das empresas para que possam garantir a exoneração, é contratar por conta própria administradores ou síndicos que ajudam a manter esta irregularidade. Ele afirma que “esse ato também contraria o Código Civil, que determina uma eleição em assembleia ordinária, devidamente convocada para escolher o síndico”.
Essa prática abusiva dá ao morador que se sentir prejudicado o direito de rever os valores não recolhidos para que sejam devidamente pagos. “O direito de ação é assegurado a todos, condômino ou síndico, podendo ser pedida a anulação da cláusula, se houver. Em alguns casos pode haver o direito do pedido de pagamento regressivo com relação às taxas isentadas anteriormente”, esclarece o coordenador.
No fim, cabe ao condômino ficar atento e buscar os seus direitos. De preferência, é preciso resolver o problema durante os cinco anos em que a construtora é obrigada a se responsabilizar pelas adequações em qualquer área do condomínio e também pelo prazo prescricional das cobranças de taxas condominiais, firmadas recentemente pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
No caso do residencial supracitado, o Park Style, depois de muitas assembleias e esforços promovidos pelos inquilinos e outros proprietários, neste ano, os condôminos conseguiram um acordo com a construtora. A empresa ficou responsável por pagar o que devia em forma de suporte em possíveis reformas, além de materiais e objetos que faltam na área comum do empreendimento.
Perguntada sobre essa atividade de auto isenção nas taxas de condomínios, a Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Goiás (Ademi-GO) respondeu que desconhece casos de empresas que não se comprometem com as taxas dos apartamentos vazios após a entrega, e garante que esta prática não condiz com a realidade de suas associadas. A entidade congrega empresas do ramo de incorporação imobiliária, e atua para garantir a sustentabilidade do mercado imobiliário no Estado de Goiás.
Fonte: Jornal Opção